Contratar um seguro para o condomínio é, ao mesmo tempo, uma obrigação legal e uma das decisões mais delicadas da gestão condominial. Porém, um erro comum — e com potencial de gerar grande prejuízo — é optar por corretoras que não são especializadas em seguros de responsabilidade civil voltados especificamente a condomínios.
Esse tipo de cobertura, que tem como finalidade proteger o condomínio e o síndico em casos de danos causados a terceiros, exige conhecimento técnico. E é justamente aí que residem os maiores problemas: corretores pouco familiarizados com o universo condominial frequentemente oferecem produtos genéricos ou mal estruturados, que falham justamente quando o sinistro acontece.
A experiência prática mostra os impactos de decisões equivocadas
Atuei por quatro anos no jurídico de uma multinacional de seguros, com forte tradição no segmento, onde pude observar de perto inúmeros litígios entre condomínios e seguradoras. Em muitos desses casos, o problema não estava na negativa indevida da cobertura, mas sim na contratação mal orientada, que resultava em apólices com cláusulas excludentes mal compreendidas.
Por exemplo: danos causados por fechamento automático de portões frequentemente geram pedidos de indenização. Mas, antes de qualquer medida, é necessário avaliar se o dano foi causado por responsabilidade do condomínio ou do próprio condômino — e, mais importante, se há cobertura prevista na apólice para esse tipo de evento.
Contrato mal interpretado, prejuízo certo
Um exemplo bastante didático é o seguinte caso:
TJ-SP – Apelação Cível: 1049599-13.2022.8.26.0100 – Julg. 10/12/2024
O condomínio alegou que os danos causados por rompimento de tubulação deveriam ser cobertos como “responsabilidade civil”, com limite mais alto.
A seguradora enquadrou o caso na cobertura por “vazamento de tubulações”, com limite de R$ 50 mil (já pago).
O Tribunal confirmou que:
• Danos por água estavam expressamente excluídos da cobertura de responsabilidade civil;
• O contrato previa cobertura apenas na categoria específica, com valor limitado;
• A indenização complementar era indevida.
Esse tipo de situação é típico quando o corretor não domina os limites e exceções contratuais — e o condomínio, por sua vez, não conta com assessoria jurídica que o oriente na contratação e leitura da apólice.
A assessoria jurídica contínua é indispensável
Muito se fala sobre a importância de ter advogado para “resolver problemas”, mas o verdadeiro diferencial está em ter uma assessoria jurídica preventiva e constante.
Essa assessoria vai muito além de ajuizar ações:
• Orienta a contratação do seguro adequado ao perfil e riscos do condomínio;
• Analisa as cláusulas e exclusões da apólice, garantindo segurança jurídica na contratação;
• Acompanha o sinistro desde o primeiro contato, evitando erros no acionamento;
• Avalia se cabe ou não uma ação judicial, evitando demandas descabidas e caras.
Lembre-se: mover uma ação sem fundamentos sólidos pode gerar um prejuízo ainda maior. Caso perca o processo, o condomínio terá de arcar não apenas com os próprios custos, mas também com os honorários de sucumbência da parte contrária. Além disso, sem base legal clara, é comum o condomínio não obter nenhum reembolso das despesas judiciais, acumulando ainda mais prejuízo financeiro e institucional.
Relação com o Código de Defesa do Consumidor
Muitos condomínios sequer sabem que, em sua relação com seguradoras, são considerados consumidores — e, portanto, protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Com base nisso, é possível questionar cláusulas abusivas e obter indenizações justas, como no caso abaixo:
TJ-SP – Apelação Cível: 1004365-32.2022.8.26.0037 – Julg. 22/12/2024
A seguradora recusou cobertura para dano elétrico em elevador, aplicando depreciação de 90% sobre o equipamento.
O Tribunal decidiu que:
• A cláusula era abusiva, pois esvaziava o objeto do seguro;
• Aplicou os arts. 51, IV, e 54, §4º, do CDC, garantindo o direito à indenização no limite da cobertura contratual;
• A seguradora foi condenada a pagar o valor integral, descontada apenas a franquia.
Sem assessoria jurídica especializada, esse tipo de resultado dificilmente seria alcançado — e o condomínio teria que arcar sozinho com os custos de reparo de um elevador, item essencial e de alto valor.
Notificação extrajudicial: ferramenta estratégica
Em muitos casos, antes de ajuizar uma ação, o envio de uma notificação extrajudicial fundamentada juridicamente pode ser suficiente para pressionar a seguradora a cumprir suas obrigações. Essa estratégia pode evitar longos processos, custos judiciais e o risco de perda da causa.
Além disso, muitos condomínios não têm caixa suficiente para cobrir reparos emergenciais, como substituição de elevadores, reforma estrutural ou danos elétricos — o que torna a agilidade da indenização ainda mais importante.
Conclusão: o barato pode sair caro
A contratação de seguros condominiais não pode ser feita apenas com base em preço ou amizade com o corretor. O condomínio precisa de uma apólice que atenda às suas necessidades reais e de uma assessoria jurídica que ofereça:
• Apoio técnico para contratação correta;
• Prevenção de litígios desnecessários;
• Defesa do condomínio em sinistros complexos;
• Respaldo nas negociações com seguradoras;
• Segurança jurídica para o síndico e para a coletividade.
Gestão moderna e segura é gestão profissional. E, quando o assunto é responsabilidade civil e seguro condominial, o conhecimento jurídico aliado à experiência técnica faz toda a diferença entre evitar prejuízos ou acumulá-los.