Inspeção predial: por que e quando contratar?  

Inspeção Predial

A inspeção predial não é a solução em si, mas sim uma auditoria técnica que orienta o plano de manutenção do condomínio e ajuda a definir prioridades nos reparos. 

Você já pensou que existem semelhanças entre conduzir aviões e administrar condomínios? Parece mentira, mas as tarefas de um piloto e de um síndico têm similaridades. Paulo Werneck, síndico profissional há mais de 10 anos, é também piloto — atualmente faz cerca de dois voos internacionais por mês. Como síndico, atua principalmente na implantação e gestão de condomínios-clube, alguns com quase 500 unidades.  

Sua formação como piloto, afirma, ajuda muito na sindicatura, principalmente nos processos de checklist. “Na aeronave, o piloto precisa estar por dentro das manutenções. O manual do fabricante prevê o que deve ser feito e quando. Da mesma forma que um piloto, o síndico não realiza as manutenções, mas precisa conhecê-las a fundo. Recomendo seguir o manual fornecido pelas construtoras e a norma ABNT NBR 5674, que indica qual revisão deve ser feita, em que periodicidade e por quem”, diz.   

A norma ABNT NBR 5674 estabelece os requisitos para o sistema de gestão da manutenção de edificações, visando preservar as ca racterísticas originais da construção e prevenir a perda de desempenho devido à degradação. Para Werneck, muitos síndicos não têm noção da seriedade do cargo. “Na aviação, não podemos errar, mas temos uma fiscalização séria por parte da ANAC. Já nos condomínios, muitas vezes, somente ao assumir a administração, descobrimos que a gestão anterior agiu errado”, compara.   

Se há dúvidas sobre o passado do empreendimento, Paulo recomenda a contratação de uma inspeção predial. Ele se lembra de casos em que uma vistoria detalhada detectou desde extintores vencidos até problemas construtivos estruturais. “Nos meus condomínios, atuo 100% baseado na engenharia. Acredito que é o melhor remédio para o síndico se respaldar. E a dose inicial é a inspeção”, pontua Paulo, ressaltando que o intuito da inspeção não é culpar gestões passadas, mas oferecer um norte para que o novo gestor trace o plano diretor da edificação.   

Inspeção: luz sobre o problema  

Além da comparação feita por Paulo Werneck entre aviões e condomínios, também é possível relacionar a manutenção e a inspeção predial dos edifícios à saúde das pessoas. “Imagine pedir o mesmo exame de rotina para um atleta e para um sedentário. O exame é o mesmo, mas o resultado esperado reflete o histórico de cuidados de cada um. A inspeção predial funciona da mesma forma: ela é um ‘exame’ que revela o estado atual da edificação”, explica Claudio Silva, engenheiro, especialista em Estruturas e Patologias das Edificações, que há quase 25 anos atua na área condominial.   

Claudio acrescenta que a inspeção funciona como diagnóstico, não como tratamento. “Uma edificação verdadeiramente saudável é aquela que vive sob um eficiente plano de manutenção contínuo, onde a inspeção periódica deixa de ser um evento temido para se tornar um processo de auditoria”, pontua.  

Para o engenheiro, os síndicos devem ser reeducados, já que a inspeção predial não é a salvação para resolver os problemas do prédio. Quem manda é a manutenção, orienta: “A salvação é instaurar um plano de manutenção na edificação. A inspeção é uma auditoria desse plano, serve para entender se ele está sendo cumprido e se há falhas que devem ser ajustadas. É como uma auditoria fiscal nas contas, que é usual nos condomínios.”    

A norma ABNT NBR 16747 estabelece diretrizes, conceitos, terminologia e procedimentos para a inspeção predial. Pela norma, a inspeção predial “é um conjunto de atividades que avaliam as condições técnicas de uma edificação, incluindo todos os seus sistemas e subsistemas, com o objetivo de identificar o estado de conservação, apurar causas de anomalias e falhas de manutenção, e indicar ações necessárias para sua conservação”. Claudio completa: “A inspeção não resolve o problema, ela apenas coloca luz sobre ele.”    

Fundamental, na opinião do engenheiro, é saber com qual objetivo o síndico busca a contratação de um relatório técnico. Se for para uma questão judicial, o instrumento contratado deve ser a perícia. Se a necessidade for uma orientação para montar a previsão orçamentária do condomínio, uma vistoria mais superficial pode servir. “Para um condomínio que está na inércia, pode ser um começo”, diz.   

No caso da inspeção predial, há a constatação das falhas e suas criticidades, a partir do cruzamento com elementos históricos e documentações da edificação. “O engenheiro ou arquiteto que fará a inspeção é um clínico geral. Se ele detectar algo que careça de um maior aprofundamento, deve recomendar ao síndico procurar um especialista. Por exemplo, se há uma infiltração na garagem, deve-se consultar um projetista de impermeabilização para aprofundar e complementar o relatório”, explica Claudio. 

Quais são as prioridades  

A arquiteta Vanessa Pacola foi coordenadora da Câmara de Inspeção Predial do Ibape-SP (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia) e responsável pelas cartilhas de inspeção predial da entidade. Trabalha com perícias e inspeções prediais, e atende condomínios e principalmente construtoras, visando diminuir ocorrências de manutenção e assistência técnica pós-obra.    

Ela reforça que não basta os síndicos receberem o manual de uso do condomínio e tê-lo como um livro de cabeceira que nunca lemos. “É preciso fazer o plano de manutenção. Há construtoras que fornecem assinaturas de sistemas de gestão de manutenção para o síndico. Outras fazem vistorias proativas, dentro do período de garantia, para que um profissional oriente o gestor. Isso ocorre porque não é raro o síndico negligenciar o período de manutenção de cinco anos e processar a construtora ao quarto ou quinto ano, embora a causa do problema seja a falta de manutenção prevista no manual de uso”, arremata.   

Na prática, Vanessa nota que os síndicos costumam se ater apenas às manutenções exigidas por lei — como limpeza do reservatório de água e revisão de mangueiras e extintores de incêndio. “Eles se esquecem de que receberam o manual de uso e operação do empreendimento, e que esse documento é mandatário. Nele consta que, a cada dois anos, devemos tratar juntas de dilatação, que precisamos pintar a fachada a cada três anos, e que, anualmente, precisamos checar a camada de proteção da impermeabilização e, periodicamente, limpar ralos. Percebemos que muitas verificações não são feitas quando chegamos em um condomínio e vemos uma árvore nascendo no ralo da laje”, exemplifica.  

Inspeção predial e plano de manutenção são assuntos intimamente ligados. Vanessa orienta que os síndicos deem prioridade às manutenções em atraso, “já que a ação do tempo degrada os sistemas”, completa. Ela reforça que um sistema é projetado para uma determinada vida útil, mas que, para manter seu desempenho e durabilidade, obrigatoriamente a manutenção deve ser feita nos prazos corretos. “Na faculdade, nos ensinam que projetamos estruturas para 60 anos. Isso não significa que prédios com 60 anos irão cair, mas que eles precisam ser revisitados, entendendo como está a manutenção. E, mais uma vez, a analogia com o corpo humano é perfeita. Há maratonistas que envelhecem muito bem, mas temos jovens senhores que tiveram sua manutenção negligenciada”, resume Vanessa, que aponta outra vantagem de se realizar a inspeção da edificação: ela ajuda a planejar melhorias no condomínio. Por exemplo, a inspeção pode detectar que o boiler para aquecimento da água está no final de sua vida útil. “Hoje, existe uma infinidade de possibilidades para aquecimento de água. Por exemplo, pode ser instalada energia solar, zerando o custo de energia das áreas comuns”, relata a arquiteta.    

O engenheiro Claudio Silva acredita que é preciso mudar a forma de atuar de muitos síndicos. “Muitos só tratam as sequelas, e não as causas. A inspeção mostra uma foto ruim porque, desde o começo da edificação, é cobrada uma taxa condominial baixa e não há dinheiro previsto para a manutenção. A situação vai sendo empurrada exercício a exercício, degradando a edificação, gerando mais conflitos e dissabores. Contrata-se a inspeção quase como um remédio milagroso, numa clara inversão. O correto é definir a cota condominial de acordo com o plano de manutenção”, resume.   


Agradecimento aos entrevistados    

Na ordem, de cima para baixo: Paulo Werneck (síndico profissional); Claudio Silva (engenheiro) e Vanessa Pacola (arquiteta)



Matéria publicada na edição 314 ago/25 da Revista Direcional Condomínios

Não reproduza o conteúdo sem autorização do Grupo Direcional. Este site está protegido pela Lei de Direitos Autorais. (Lei 9610 de 19/02/1998), sua reprodução total ou parcial é proibida nos termos da Lei.


Autor

  • Luiza Oliva

    Jornalista com larga experiência em reportagens e edição de revistas segmentadas. Editora do site e Instagram O melhor lugar do mundo, voltado à decoração, arquitetura e design. Editora da Panamby Magazine, publicação dirigida aos moradores do bairro do Panamby, região do Morumbi, em São Paulo. Desde 2005 também atua na área da educação, com publicações especializadas e cursos para formação de professores.