Contudo, e a despeito da existência de novel legislação de perfil propositivo e de elogiável alcance, parece ter esse mesmo códex incorporado alguns indesejáveis retrocessos, senão imponentes embaraços, quase insuperáveis para a gestão de condomínios, especialmente quando se trata de discorrer sobre a temática do equilíbrio econômico e financeiro das estruturas condominiais.
Dentre estes obstáculos, encontram-se as regras que regem a cobrança de multa e de juros moratórios e sancionatórios que decorrem do estado de inadimplência da cota condominial; isso porque, a atual norma de regência autoriza que a cobrança de juros moratórios de cotas condominiais em atraso possa se dar em patamar superior a 1% (um por cento) ao mês, desde que tal regra se encontre prevista no corpo da Convenção de condomínio. É o que afirma o Art. 1.336, § 1º do Código Civil Brasileiro: "O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito".
Outrossim, o Código Civil não estabelece limite máximo para a taxa de juros mensal a ser cobrada, o que acarreta estado e sensação de expressiva insegurança, sentimento indesejável para as relações jurídicas de direito privado.
Ademais, no âmbito dos tribunais superiores, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia se pronunciado no sentido de admitir a possibilidade da cobrança de juros de mora em nível superior a 1%, desde que a Convenção de condomínio expressamente assim dispusesse.
Com efeito, constatamos que a insegurança jurídica no campo da definição dos valores de multa e dos juros moratórios e sancionatórios reina absoluta. Isso porque, conquanto se possa colher no repertório jurisprudencial pátrio, farto material produzido na linha da tentativa de colmatação das lacunas legais, verifica-se nas práxis das cobranças condominiais, a utilização de indicadores multivariados, dando mostra de que em alguns condomínios se adota a regra prevista no Art. 1.036, parágrafo primeiro do Código Civil. A saber, a cobrança de juros residuais de 1% ao mês, enquanto outros condomínios entendem por cobrar juros convencionados de 10%. E há ainda aqueles que se posicionam no sentido de cobrar até mesmo percentuais inferiores ou superiores a estes mesmos 10%, situação esta que se vê agravada quando a contextualizamos no cenário da pandemia do novo Coronavírus, onde a inadimplência se apresenta como um fenômeno imanente à crise sanitária em nosso País.
Assim é que o Projeto de Lei 4.349/2020 [apresentado à Câmara Federal pelo deputado Tiago Dimas em 25/08/2020] procura atender a essa particular demanda, especialmente quando passa a estabelecer que o condômino ou possuidor que deixar de pagar a cota condominial estará sujeito aos juros moratórios convencionados, respeitado o limite máximo de 10% (dez por cento) ao mês, ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês.
Relativamente à multa, o PL reprisa o texto vigente e insiste no percentual de até 2% (dois por cento) sobre o débito; contudo, inovando a ordem jurídica, e dentro de uma proposição, a nosso ver benfazeja, o texto proposto assinala que o devedor contumaz, como tal considerado aquele condômino ou possuidor que deixa repetidas vezes de pagar a sua cota condominial, poderá ser obrigado a pagar multa acima de 2%, observado o limite máximo de 10% (dez por cento) sobre o débito, desde que aprovada a sanção em assembleia por quórum qualificado de 3/4 (três quartos) da massa condominial.
Aduz ainda o projeto de lei que o condômino que se protrair inerte, deixando de cumprir suas obrigações condominiais, haverá de pagar a multa prevista no ato constitutivo ou na Convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que vierem a ser objeto de apuração; ademais, não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, mediante a deliberação de 2/3 (dois terços) no mínimo dos condôminos restantes, decidir sobre a cobrança da multa.
Vemos assim, de um lado, um claro rompante de lucidez do legislador, ao perceber, após 18 anos de vigência legal, que o Código Civil demandava por certo uma necessária atualização, admitindo a imprescindibilidade de um maior apenamento do condômino inadimplente; contudo, a se lamentar, esse mesmo legislador, surdo aos brados da desafortunada gestão condominial contemporânea, persiste no erro de prever quóruns qualificados para admissão dos sistemas de juros e de multa, em percentuais dificilmente atingíveis, correndo o risco de tornar natimorta a regra que ainda sequer bramiu o seu choro de neonata na maternidade das leis.
Espera-se que nos debates legislativos, a norma proposta possa sofrer aperfeiçoamento, tornando-a mais condizente com a realidade condominial, a qual impõe a disponibilização de ferramentas mais ágeis, mais arrojadas e mais eficientes, que tenham o condão de conferir ao síndico a máxima efetividade em sua gestão, a qual passa necessariamente pelo procedimento de cobrança dos inadimplentes, tanto os de natureza eventual como os daqueles qualificados como devedores contumazes, vez que o status de inadimplência milita contra a saúde financeira do condomínio, situação esta que deve ser evitada ou desestimulada o máximo possível.
Não reproduza o conteúdo sem autorização do Grupo Direcional. Este site está protegido pela Lei de Direitos Autorais. (Lei 9610 de 19/02/1998), sua reprodução total ou parcial é proibida nos termos da Lei.